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Fronteira Cerrado: desmatamento está ligado a conflitos e grilagem

Comunidades tradicionais relatam ameaças, tiros e destruição de pontes em meio a disputa por terras no Vão do Uruçu, região marcada pela expansão da fronteira agrícola brasileira.

Portal Noticias Curitiba
Fronteira Cerrado: desmatamento está ligado a conflitos e grilagem Trabalhador rural do Vão do Uruçu segura ferramenta usada no cultivo familiar em área de conflito fundiário. — Foto: Radioagência Nacional / Divulgação

 Conflitos agrários no Maranhão ameaçam famílias do Cerrado; comunidades do Vão do Uruçu denunciam violência e pressão de grileiros ligados ao agronegócio.


Povos do Cerrado enfrentam escalada de violência no Maranhão

Considerados os “guardiões do Cerrado”, povos e comunidades tradicionais que vivem de forma sustentável no bioma vêm enfrentando uma crescente onda de conflitos agrários impulsionados pela expansão da fronteira agrícola no Brasil.

No Vão do Uruçu, a cerca de 300 quilômetros do centro de Balsas (MA), mais de 20 famílias vivem sob pressão para deixar as terras que ocupam há décadas. O município, um dos epicentros do agronegócio maranhense, concentra parte das disputas mais intensas do estado.

A equipe da reportagem acompanhou a primeira reunião dos moradores com uma advogada popular, em meio ao clima de medo e tensão. O posseiro Osmar Paulo da Silva Santos, de 65 anos, expressou o desespero das famílias diante das ameaças constantes:


“Ave Maria, foi o desassossego maior que nós já tivemos. Antes desse povo chegar por aqui, nós todos vivíamos sossegados. E hoje a gente vive tão coagido por causa deles.”


Os moradores relatam que são pressionados a aceitar acordos para reduzir as áreas de trabalho a 50 hectares — ou simplesmente abandonar as terras. Segundo eles, grileiros estariam tentando tomar o território para revendê-lo à produção de soja.


Ameaças e medo nas comunidades rurais

Os relatos são alarmantes. Famílias afirmam ter ouvido disparos de armas de fogo nas proximidades das casas, em um claro esforço de intimidação. Osmar conta que vive sob medo constante:


“Nós temos corrido medo de uma bala variada acertar na gente. Lá em casa, são acostumados a fazer fogo para me amedrontar, só pode ser isso. Tem dia que a gente escuta as balas passar zunindo por cima de casa. Por que eles não atiram para o outro rumo? Eles só atiram pro rumo de casa!”


Os posseiros afirmam que a empresária Sheila Lustosa Parrião, natural de Palmas (TO), apareceu na região em 2020 cobrando pela posse das terras. Ela se apresenta como representante da empresa Castelo Construtora, Incorporadora e Reflorestadora.

Em 2023, o Ministério Público do Maranhão (MPMA) acusou Sheila de ordenar a derrubada de uma ponte pública que ligava comunidades do Vão do Uruçu. Procurada pela reportagem, a empresária informou que encaminharia o caso ao setor jurídico, mas não respondeu mais aos contatos.


Maranhão lidera conflitos agrários no Brasil

Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Maranhão é o estado com maior número de conflitos por terra e água no país. Em 2023, foram registrados 420 casos, um dos índices mais altos da última década.

O juiz aposentado Jorge Moreno, coordenador do Comitê de Solidariedade à Luta pela Terra do Maranhão, afirma que a violência se espalha por todas as regiões do estado:


“Não existe um município do Maranhão, dos 217, que não esteja sofrendo algum tipo de violência, assédio, intimidação ou ameaça — e muitos deles com assassinatos de camponeses. A situação é muito grave.”



Governo aposta na regularização fundiária

Para tentar reverter esse cenário, o governo do Maranhão lançou o programa Paz no Campo, com foco na regularização fundiária e no reconhecimento de comunidades tradicionais.

De acordo com Anderson Pires Ferreira, presidente do Instituto de Colonização e Terras do Maranhão (Iterma), o programa já entregou 18 mil títulos de propriedade e regularizou 27 comunidades quilombolas:


“Só existe uma forma de pacificar o campo, a zona rural: é regularizando. Dessa forma a gente pacifica o estado.”


Mesmo assim, o gestor reconhece que a expansão da agropecuária no Cerrado maranhense continua alimentando disputas fundiárias.


“À medida que a agropecuária vai se expandindo, aparecem essas matrículas frágeis, sem geolocalização. Quanto mais aumentam as áreas de produção, mais essas áreas encontram posseiros, agricultores familiares e comunidades tradicionais.”


O Iterma também informou ter identificado 300 mil hectares de terras devolutas (áreas públicas sem destinação) e 150 mil hectares de terras griladas já retomadas pela atual gestão.


Um bioma sob pressão

O avanço da monocultura e do desmatamento no Cerrado, considerado o “berço das águas” do Brasil, não ameaça apenas comunidades locais, mas também o equilíbrio hídrico de todo o país. A série especial Fronteira Cerrado revela como a degradação desse bioma compromete nascentes, rios e modos de vida tradicionais.

Enquanto as famílias do Vão do Uruçu tentam resistir à pressão do agronegócio, cresce a urgência por políticas que conciliem produção, preservação e justiça social no campo brasileiro.






































Pergunta para interação:

Você acredita que a regularização fundiária é suficiente para conter os conflitos agrários no Cerrado?




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