OMS retirou homossexualidade da lista de doenças em 1990
Em 17 de maio de 1990, a OMS deixou de classificar a homossexualidade como doença, marcando uma vitória histórica do movimento LGBT. Curitiba e o Brasil celebram 35 anos de luta contra a LGBTfobia e pela igualdade de direitos.

Uma vitória contra a ignorância e o preconceito
Em 16 de maio de 1990, qualquer pessoa que consultasse o Código Internacional de Doenças (CID), publicação oficial da Organização Mundial da Saúde (OMS), encontraria a homossexualidade listada sob o código 302.0 — como se fosse uma condição médica. No dia seguinte, a 43ª Assembleia Mundial da Saúde mudaria essa realidade para sempre. A homossexualidade foi oficialmente retirada da lista de doenças, marcando uma virada histórica na luta por dignidade e respeito à diversidade sexual.
Desde 2004, essa data passou a ser reconhecida internacionalmente como o Dia Internacional de Combate à LGBTfobia, lembrado todos os anos em 17 de maio. Em 2025, completam-se 35 anos dessa conquista global, e o Brasil — especialmente Curitiba e o Paraná — reforçam o papel dos movimentos sociais na promoção da equidade e dos direitos humanos.
O peso da patologização: uma história de exclusão e dor
Segundo o professor de Direito da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenador do Núcleo TransUnifesp, Renan Quinalha, a ideia de que a homossexualidade seria uma patologia remonta ao século 19. “A primeira vez que o termo aparece, em 1869, é num tratado de psicopatologia sexual. Já surge sob um viés médico, como desvio”, explica o pesquisador.
Com o passar das décadas, essa visão foi reforçada por instituições médicas e jurídicas. Hospitais psiquiátricos e manicômios judiciais recebiam homossexuais sob a justificativa de tratamento, onde eram submetidos a procedimentos de tortura como:
Eletrochoques
Convulsoterapia
Lobotomia
“Terapias de conversão”
O CID de 1948 classificava a homossexualidade como transtorno de personalidade, enquanto o DSM-I, publicado em 1952 pela Associação Americana de Psiquiatria (APA), a definia como “desvio sexual”.
O movimento LGBT entra em cena: décadas de mobilização
Na década de 1970, a resistência organizada começa a ganhar força. Em 1973, a APA retirou a homossexualidade de seu manual. O Brasil seguiu esse caminho em 1985, após um abaixo-assinado promovido pelo Grupo Gay da Bahia, com apoio de personalidades como Fernando Henrique Cardoso e Mário Covas.
“Essa decisão da OMS, em 1990, reforça o processo de despatologização e legitima os direitos da população LGBT mundialmente”, ressalta Quinalha.
A partir dessa conquista, foi possível avançar em políticas públicas, visibilidade e garantias legais. Mas os desafios persistem.
LGBTfobia ainda resiste: a luta continua
Apesar da vitória na esfera médica, a LGBTfobia persiste em diferentes contextos. Muitas comunidades terapêuticas, especialmente as vinculadas a setores religiosos fundamentalistas, ainda oferecem a chamada “cura gay” — prática proibida por resoluções do Conselho Federal de Psicologia e do Conselho Federal de Medicina.
“Essas terapias ainda acontecem em muitos lugares, mesmo sendo ilegais. Há um discurso travestido de cuidado que, na verdade, perpetua a violência”, afirma Quinalha.
Avanços no Brasil: do reconhecimento oficial à celebração da diversidade
Em 2010, o Ministério da Saúde oficializou o Dia Internacional de Combate à LGBTfobia como data de reflexão e mobilização no Brasil. Nas redes sociais, a ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, reforçou o papel do Estado:
“A data é um momento de resistência, mas também de celebração das conquistas obtidas por meio da luta de movimentos sociais e ativistas, que, ao longo das décadas, vêm construindo um Brasil mais justo, diverso e plural.”
No entanto, ela alerta: a população LGBT ainda sofre violações sistemáticas de direitos, seja pela falta de acesso à saúde, pela violência, ou pela exclusão em espaços educacionais e profissionais.
Curitiba e o Paraná na luta pela diversidade
Curitiba tem um histórico de engajamento com a causa LGBT+. Eventos como a Parada da Diversidade, projetos educativos em escolas públicas e ações de enfrentamento à violência ganham força na capital paranaense.
Organizações locais como o Grupo Dignidade e o Aliança Nacional LGBTI+ Paraná realizam um trabalho fundamental, tanto no acolhimento de pessoas vítimas de LGBTfobia quanto na proposição de políticas públicas regionais.
Em 2023, a Prefeitura de Curitiba, por meio da Assessoria de Políticas para Diversidade Sexual, lançou o programa "Curitiba Diversa", promovendo formações sobre respeito à diversidade em instituições públicas e privadas.
35 anos depois: por que essa data importa?
A decisão da OMS não foi apenas uma mudança técnica. Foi uma afirmação política e simbólica de que orientações sexuais diversas não são anomalias, mas expressões legítimas da condição humana.
Refletir sobre essa conquista nos ajuda a entender o valor da memória, da resistência e da mobilização coletiva. Cada avanço na legislação, cada política de inclusão e cada espaço conquistado são frutos dessa trajetória iniciada por pessoas que ousaram existir num mundo que dizia que elas estavam erradas.
Próximos passos: educação, leis e representatividade
A luta contra a LGBTfobia precisa avançar em três frentes:
Educação: Inserção da temática de gênero e diversidade sexual nos currículos escolares.
Legislação: Aprovação de leis federais que criminalizem explicitamente a LGBTfobia, como já ocorre com o racismo.
Representatividade: Ampliação da presença LGBT em espaços de poder — parlamentos, universidades, mídia e mercado de trabalho.
Conclusão: celebrar e proteger direitos
O Dia Internacional de Combate à LGBTfobia é mais que uma data simbólica — é um lembrete de que direitos conquistados podem ser ameaçados, e que a democracia depende da inclusão de todas as vozes.
Em Curitiba, no Paraná e no Brasil, a construção de uma sociedade plural passa pela valorização da diversidade sexual e de gênero. Respeito não é ideologia: é base de qualquer civilização que se pretende justa.
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